O Regime de Economia Familiar e a Previdência Social no Brasil

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 Introdução

O regime de economia familiar possui uma relevância social ímpar no sistema previdenciário brasileiro. Essa modalidade abrange trabalhadores rurais que exercem sua atividade sem vínculo empregatício e com mútua colaboração entre os membros da família. Até 1990, a legislação dispensava os segurados especiais da obrigatoriedade de recolhimento de contribuições previdenciárias para fins de concessão de benefícios, resguardando os princípios da solidariedade e da universalidade da cobertura. Neste artigo, analisamos os fundamentos legais e jurisprudenciais que garantem esse direito, com destaque para o marco da Lei nº 8.213/91, que consolidou a proteção a esse grupo.


Fundamento Legal da Dispensa de Contribuição

Antes da Constituição Federal de 1988, os trabalhadores rurais não tinham cobertura previdenciária integral. A promulgação da Constituição trouxe uma mudança significativa, assegurando aos segurados especiais a proteção previdenciária, independente de contribuições diretas até a edição da Lei nº 8.212/91 e da Lei nº 8.213/91.

1. Base Constitucional

  • Artigo 195, § 8º da CF/88: Estabelece que os segurados especiais contribuem para a seguridade social de forma diferenciada, com base na comercialização da produção, dispensando contribuições diretas para acesso aos benefícios previdenciários.
  • Artigo 201, § 7º da CF/88: Garante a aposentadoria para trabalhadores rurais com critérios mais flexíveis, reconhecendo a peculiaridade do regime de economia familiar.

2. Lei nº 8.213/91

A partir da vigência da Lei nº 8.213/91, que regula os benefícios previdenciários, ficou consolidado o direito dos segurados especiais à aposentadoria e outros benefícios, sem exigência de contribuições anteriores a 1991. O artigo 39 da lei estabelece que os trabalhadores rurais têm direito a benefícios por idade e tempo de serviço, desde que comprovem a atividade rural.

  • Artigo 55, § 2º da Lei nº 8.213/91: Admite o cômputo de tempo de serviço rural, ainda que anterior à obrigatoriedade de contribuições, desde que comprovado o exercício da atividade.

Aposentadoria e Benefícios Sem Contribuição Até 1990

O Decreto-Lei nº 4.657/1942, que antecedeu as reformas previdenciárias, não previa a inclusão de trabalhadores rurais no sistema previdenciário. Somente em 1963, com a criação do FUNRURAL (Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural), houve uma tentativa inicial de proteção ao trabalhador do campo, mas ainda sem exigência de contribuição obrigatória.

Com a Lei nº 8.213/91, a exigência de recolhimentos foi introduzida apenas a partir da comercialização da produção rural, respeitando a isenção de contribuições para períodos anteriores. Dessa forma, os segurados especiais puderam requerer benefícios como aposentadoria por idade, auxílio-doença e salário-maternidade, mediante a comprovação de trabalho rural em regime de economia familiar.


Jurisprudência

O entendimento jurisprudencial consolidou a tese de que não há necessidade de recolhimento de contribuições para o período anterior a 1991, desde que haja comprovação da atividade rural. A seguir, destacam-se precedentes relevantes:

1. Tema 532/STJ – Início de Prova Material e Prova Testemunhal

  • Caso: REsp 1.304.479/SC
  • Ementa: “É possível o reconhecimento do tempo de serviço rural em regime de economia familiar para fins previdenciários, independentemente de contribuições, mediante início de prova material complementado por prova testemunhal.”
  • Relevância: Este tema reforça que o segurado especial tem direito a benefícios previdenciários, mesmo sem recolhimento de contribuições, desde que comprove a atividade por meio de documentos e testemunhas.

2. Dispensa de Contribuição até 1991

  • Caso: REsp 1.348.633/SP
  • Ementa: “O tempo de serviço rural anterior à vigência da Lei nº 8.213/91 pode ser computado para fins de concessão de benefícios previdenciários, ainda que o segurado especial não tenha realizado contribuições.”
  • Impacto: Esse julgado consolida a aplicação do artigo 55, § 2º da Lei nº 8.213/91, destacando que a ausência de recolhimento não é impeditivo para o reconhecimento do direito.

3. Documentação em Nome de Terceiros

  • Caso: REsp 1.321.493/PR
  • Ementa: “Documentos em nome de terceiros podem ser aceitos como início de prova material para comprovação de atividade rural em regime de economia familiar, desde que corroborados por prova testemunhal.”
  • Fundamento: Em muitas áreas rurais, a titularidade formal de terras é precária, tornando frequente a emissão de documentos em nome de parentes ou vizinhos.

4. Benefícios Antes de 1991

  • Caso: AgRg no REsp 1.183.585/PR
  • Ementa: “A aposentadoria por idade rural é devida mesmo que o segurado especial tenha iniciado sua atividade em período anterior à obrigatoriedade de recolhimento de contribuições.”
  • Relevância: O tribunal reforçou que o regime de economia familiar deve ser analisado com base na atividade exercida e não na formalidade de contribuições.

Considerações Finais

A proteção previdenciária ao segurado especial em regime de economia familiar, especialmente para períodos anteriores a 1991, representa um marco de inclusão e justiça social. A legislação e a jurisprudência têm reconhecido as peculiaridades do trabalho rural e a impossibilidade de exigir recolhimentos de contribuições em um período em que esses trabalhadores sequer eram plenamente incluídos no sistema previdenciário.

Essa abordagem respeita o princípio da dignidade da pessoa humana e assegura que o direito previdenciário cumpra sua função social. No entanto, ainda há desafios quanto à burocracia na comprovação da atividade rural, exigindo que o judiciário continue a desempenhar um papel fundamental na efetivação desses direitos.

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