A recente atualização da NR-1, em vigor a partir de 26 de maio de 2025 (Portaria MTE nº 1.419/2024), marcou um divisor de águas na legislação de segurança do trabalho. Pela primeira vez, a saúde mental dos trabalhadores foi oficialmente incorporada ao Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), equiparando sua importância à saúde física.
Essa mudança não é apenas normativa — é cultural. A nova NR-1 exige que as empresas identifiquem e controlem riscos psicossociais como assédio moral, sexual, sobrecarga emocional e ambientes tóxicos. Também estabelece direitos claros: os trabalhadores devem ser ouvidos, informados sobre os riscos e ter acesso a canais de denúncia eficazes e à possibilidade de revisão do PGR.
Essa abordagem está em consonância com a Constituição Federal (art. 1º, III e IV; art. 6º) e com a CLT, que já previa a proteção à saúde e segurança no ambiente laboral. O recado é direto: ignorar a saúde emocional do trabalhador pode gerar multas, interdições e ações judiciais.
Para atender à norma, empresas devem: mapear riscos emocionais, capacitar lideranças, criar políticas de combate ao assédio e canais de escuta ativa. É também recomendável criar comitês com foco psicossocial, oferecer apoio psicológico e rever metas excessivas.
O olhar jurídico: um novo patamar de responsabilidade
Sob a ótica do Direito do Trabalho, essa mudança representa uma expansão do dever de proteção (art. 7º, XXII, da CF). Juristas como Carlos Henrique Bezerra Leite e Sergio Pinto Martins já alertavam que a proteção à saúde no trabalho não poderia mais se restringir ao ambiente físico. Com a NR-1, a responsabilidade empresarial abrange também o invisível: o emocional, o psicológico, o relacional.
A omissão pode gerar passivos trabalhistas por danos morais e existenciais, principalmente quando há inércia frente a denúncias ou ausência de programas preventivos. A Súmula 378 do TST, embora trate da estabilidade acidentária, já indicava que o nexo entre ambiente e adoecimento mental pode ser presumido em certos casos.
Tendências internacionais: Brasil segue um movimento global
Organismos como a OIT e a ISO (especialmente a ISO 45003) já apontam a saúde mental como componente essencial da segurança ocupacional. Países como Canadá, Reino Unido e França já possuem legislações mais avançadas nesse sentido — o Brasil, com a nova NR-1, se aproxima dessas boas práticas.
A visão psicológica: prevenir é melhor do que indenizar
Psicólogos organizacionais têm reforçado que a maioria dos transtornos mentais relacionados ao trabalho são evitáveis, desde que haja ambiente saudável, previsibilidade, reconhecimento e limites. A ausência de políticas claras favorece o surgimento de “microagressões”, silenciamentos e naturalização de práticas abusivas.
Intervenções precoces — como programas de acolhimento, espaços de escuta e gestão empática — são muito mais eficazes (e baratas) do que tratar o problema já instalado. A NR-1, nesse aspecto, é ferramenta de prevenção primária.
Empresas que ignorarem a NR-1 estarão descumprindo não apenas a legislação trabalhista, mas também os critérios de governança corporativa e responsabilidade social. Isso afeta diretamente sua posição em rankings ESG, certificações internacionais e sua reputação pública.
Aderir à NR-1 não deve ser visto como “custo”, mas como investimento reputacional e jurídico, pois demonstra comprometimento com os direitos humanos, com a prevenção de litígios e com a ética organizacional.